A minha profissão possibilitou-me estar perto de pessoas em fim de vida, que sofrem doenças crónicas e de famílias exaustas, incapazes de dar mais. Existimos para lhes proporcionar algum suporte e qualidade de vida, nem que seja na morte. E há tanta vida na morte! Tive necessidade emocional de escrever, quer porque temo perder as lembranças, quer porque são demasiado significativas para partirem, comigo, na minha finitude. Aprendi que não se deve antecipar nem atrasar a morte, mas também a vida!
sábado, 10 de junho de 2017
Apresentação
Como psicóloga e como colaboradora na área da saúde, decidi escrever sobre o meu quotidiano, sobre o sofrimento humano e também sobre a cura. Mesmo que essa cura seja a partida, pois a grande maioria dos cuidados são paliativos.
To care: no duplo sentido de cuidar e de se importar.
Também aqui o penso tem este significado duplo: o penso enquanto elemento que cura e o penso enquanto acto de pensar/ analisar a situação, neste caso a ferida.
Ferida como dor/ doença, que se sente no outro, na família que o acompanha, mas também na equipa que todos os dias lida com as suas próprias dores e medos.
Para refletir e, ao mesmo tempo, exorcizar os meus fantasmas, porque ter o privilégio de acompanhar os momentos finais de alguém, ser a pessoa que escuta, dá a mão ou realiza desejos, nos dá um legado demasiado valioso para não ser partilhado. Porque me faz sentir mais humana, mais frágil e vulnerável todos os dias, mas me dá um prazer imenso a cada nova vivência viver um sentimento de paixão e admiração com as histórias de vida de cada um. As narrativas biográficas são recheadas de aventura, romance, drama... é como ler um livro no olhar dessas pessoas. Aqui sou apenas uma redatora dessas experiências, com um pouco de mim à mistura, perdoem-me a incapacidade de ser neutra ou imparcial, mas muito do que transmito é mais sentido nos poros da pele do que no conteúdo das palavras. Há muitas conversas que são tidas no silêncio, num abraço ou num olhar e terei que usar frases para vos descrever a sensação.
Penso na ferida, um blog feito de sentimentos, com histórias fictícias, baseadas em factos reais.
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